Dude vai ao Emmy. Ou melhor, nem vai tanto assim…

* Por Ricardo Henriques
Para quem costuma acompanhar as indicações ao Emmy, não foi lá uma grande surpresa a esnobada que deram em Lost esse ano. Pelo contrário, o estranho foi terem feito justiça e a série ter ganhado o prêmio de melhor drama no ano passado. A regularidade e a excelência do começo da série conseguiu “dobrar” os votantes. Como exemplo disso, só pra não ir muito longe, basta lembrar que também em 2005 o ganhador de melhor comédia foi a “quadrada” Everybody Loves Raymond, deixando a coqueluche Desperate Housewives pelo caminho (aliás, se Lost foi esnobada, Desperate praticamente levou um safanão, já que nenhuma das quatro protagonistas conseguiu uma indicação esse ano). A questão é que o Emmy é uma premiação essencialmente conservadora. Excessivamente até. Um seriado sobre gente “jovem” perdida em uma ilha deserta cercada por mistérios não é exatamente o que os acadêmicos costumam ver, já que uma das séries mais indicadas e premiadas de 10 anos pra cá é a enfadonha The West Wing. Lost sem dúvidas estaria no meu top 5, mas ainda assim não acho que a ausência de nosso querido programa entre os cinco indicados a melhor série dramática seja uma enorme injustiça. Apenas fruto de uma tradicional implicância por parte dos votantes.

Vejamos. The West Wing terminou, então claramente ia ser indicada pela última vez. O mesmo vale para The Sopranos que, além de adorada pelos acadêmicos, tem qualidade comprovada e também chegou ao seu fim. Depois de uma curta primeira temporada que foi apenas simpática, Grey’s Anatomy conquistou corações e mentes com seu elenco afinado e roteiros inspirados, recuperando um gênero que sempre fez sucesso na TV americana: o drama hospitalar. De quebra ainda chacoalhou o até então intocável reino de CSI: Crime Scene Investigation. A indicação de House, M.D. foi até certo ponto inesperada. Não pela qualidade da série, que é brilhante, mas sim porque até então as indicações se concentravam no seu protagonista. Também pesou o aumento na audiência, já que muita gente só descobriu o programa quando ele passou a ir ao ar colado no hit American Idol. Por fim, talvez a concorrente de Lost a uma vaga seria 24 Horas. É uma série de ação, o que também não é lá tão apreciado pelo Emmy. Mas a coragem dos roteiristas em brincar com a sagrada imagem presidencial (mesmo que todo mundo saiba do que George W. Bush é capaz, ninguém havia tido a cara de pau de colocar um presidente errante na TV) garantiu que a série mantivesse sua cadeira cativa, mesmo que ainda não tenha conseguido levantar a estatueta. E enquanto os números de Lost caíram um pouco, os de 24 subiram pelo terceiro ano consecutivo.

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Do elenco tivemos apenas a justíssima indicação de Henry Ian Cusick, o nosso brotha Desmond, como ator convidado. Seria franco favorito na categoria, não batesse de frente com o apelo emocional que é a indicação do lendário Michael J. Fox (para um fã de “De Volta para o Futuro” lendário não é esparro, entendam) por sua participação em Boston Legal/Justiça sem Limites. A atuação dele é apenas correta, mas, pra quem ainda não sabe, Fox se afastou da atuação para se tratar de Mal de Parkinson, tendo inclusive criado uma Fundação para ajudar na descoberta da cura da doença. Ou seja, voltar a atuar, mesmo que em uma participação pequena, pode ser considerado um esforço em nome da arte. E todos nós sabemos que essas premiações americanas adoram se utilizar de razões nada artísticas para escolher seus vencedores. Mas é bom também manter um olho aberto para Christian Clemenson que, também em Boston Legal/Justiça sem Limites, trouxe um dos personagens mais esdrúxulos e divertidos dos últimos tempos, um advogado meio pirado que mantinha sempre as mãos coladas às coxas (daí ganhando o apelido “Hands”) e dizia “bingo” em meio a comentários jurídicos complexos. Para nós, fãs de Lost, seria um anti-clímax, mas completamente justificável.

Os fãs de Matthew Fox não precisam se descabelar. Afinal, se ele ficou de fora da lista de melhor ator, está em ótima companhia. Também foram esnobados os excelentes Hugh Laurie, ganhador do último Globo de Ouro por sua atuação em House (curiosamente deixado de lado no mesmo ano em que o Emmy endossa o sucesso da série com uma indicação a melhor drama), e James Spader, que ganhou o Emmy no ano passado e o Globo de Ouro em 2005, por seu cinismo na medida certa em Boston Legal. Quer mais? James Gandolfini, o protagonista da adorada The Sopranos também ficou de fora da lista, mesmo sendo esta sua última chance de ganhar outra vez. De normal na lista escolhida, apenas a indicação sentimental de Martin Sheen pelo último ano de The West Wing e a presença de Kiefer Sutherland, repousando em sua cadeira cativa enquanto seu Jack Bauer não parte para mais 24 horas de correria.

Terry O’Quinn e Naveen Andrews viram suas chances de indicação desabarem pela forma com que seus personagens foram utilizados na segunda temporada. O Locke, mesmo que dentro de uma linha de raciocínio bastante coerente, foi transformado (e transtornado) em um cara obcecado e nada mais que isso, eternamente brincando de Tom e Jerry com o Jack. Nem de longe lembrou o personagem que, com o perdão da licença poética, fazia chover na primeira temporada. Já o Sayid… esse sumiu por boa parte do ano, foi subaproveitado. Mas é nessa mesma categoria de ator coadjuvante que foi cometida a grande injustiça contra Lost. Michael Emerson, vulgo Henry Gale, foi um espetáculo à parte, merecia ser lembrado. As cenas envolvendo ele e O’Quinn foram verdadeiras aulas de atuação. Mas nem se pode culpar o Emmy sem saber se ele foi realmente inscrito para concorrer nesta categoria, ou se entrou como ator convidado. Para quem não sabe, cada série é quem decide quem é protagonista, quem é coadjuvante e quem é convidado, ao enviar suas “applications” para a Academia. E como as pessoas podem não ver um ator que participou de boa parte da temporada como sendo um simples convidado, isso pode tê-lo prejudicado na hora das escolhas.

Entre as mulheres só mesmo Yunjin Kim teria cacife para receber uma indicação, mas a sua Sun ainda não foi aproveitada a contento. As demais precisam se esforçar mais. Se é que esforço ajuda no caso de algumas. De qualquer forma, Lost manteve seu bom aproveitamento nas categorias técnicas, embora desta vez 24 Horas seja a mais lembrada. E o bom episódio The 23rd Psalm (flashback contando o passado de Mr. Eko) teve seu roteiro indicado. Mas nessa categoria ninguém em sã consciência apostaria contra o episódio duplo de Grey’s Anatomy que, indo ao ar logo depois do Superbowl, levou a série ao primeiro lugar do ranking dos programas mais assistidos da TV americana.

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Vejamos pelo lado bom, como ninguém vai ter de ir até Los Angeles para a premiação (no máximo o Henry Ian Cusick, e mesmo assim só se ganhar, porque sua categoria tem os vencedores anunciados uma semana antes e os ganhadores são convidados a apresentar prêmio na cerimônia oficial), já podem ir se dedicando mais à terceira temporada. Afinal, um pouco mais de respeito pelo telespectador menos fanático e ainda está em tempo de trazer a Academia de volta pro nosso lado. Mas o melhor mesmo, pro caso de sua indignação ser irreversível, é não dar muita atenção pra ela. Como disse o comediante Jon Stewart ao receber seu Emmy de melhor apresentador de programa de variedades: “Eu não trabalho pelas premiações. Trabalho pelo dinheiro”. E dinheiro é o que não anda faltando no cofrinho de JJ, Lindelof e companhia. Assim como não vai faltar Lost pra gente nos próximos três, quatro, cinco anos.

A premiação ocorrerá dia 27 de agosto de 2006 e será trasmitida pela rede de tv americana NBC.

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*Ricardo Henriques é jornalista, já está de férias da Copa e adoro uma festa de premiação, mesmo quando não é convidado.

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8 COMENTÁRIOS

  1. Gostei muito do comentário do Ricardo!
    Nos deu uma panorama geral das indicações e da premiação em si. Realmente, não só Lost foi ignorado, outras séries legais tb! Talvez seja a “lei da compensação”, tão famosa nesse tipo de evento nos EUA (vide Oscar, Globo de Ouro)! Tb senti falta de uma indicação para Michael Emerson (Henry Gale)… sem dúvida a participação dele foi fundamental na segunda temporada (e de qualidade superior a de muitos atores indicados)! O argumento do Ricardo para essa ausência é interessante. Tinha esquecido do detalhe das “inscrições”. Talvez,
    a permanência de Emerson garanta futuras indicações para a série! E tomara que Lost faça por merecer. Ganharemos todos!

  2. Hugh Laurie não ser indicado é uma super injustiça mesmo, o cara se transforma em sua atuação!
    Muito bem lembrado, Ricardo.

    Quanto aos losties, talvez preferiram indicar os eps a indicar um ator melhor entre todos, até pq em cada ep é um destaque diferente e um time de boas atuações.

    Na minha opinião ia ser enfadonho premiar tantos de uma mesma série, tudo bem q não entendo muito do assunto e sou tendenciosa nesse caso específico ehehe.

    Adorei a matéria 😉

    Ricardo: eu adoro sua Arial rs.

  3. Realmente, não dá pra entender a Academia, que faz essas indicações…

    Em muitas, falta coerência, em outras, a indicação tem mais um apelo “sentimental” do que propriamente técnico…

    Mas tudo bem… o que importa é que a 3ª Temporada seja melhor que a 2ª. No mais, tá valendo.

    Em tempo, parabéns Ricardo, ótimo texto com uma ótima análise das indicações…

  4. “Então tá:Lost ficou de fora. O magnífico episódio final de A Sete Palmos, também _ a não ser por uma indicação de melhor ator para Peter Krause.. As indicações para os prêmios Emmy, que acabaram de ser anunciadas, privilegiaram 24 Horas, Grey´s Anatomy, House, Os Sopranos, a saideira de The West Wing e, nas comédias, The Office, Arrested Development, Scrubs, Curb Your Enthusiasm e Two and a Half Men.

    Como é que pode?

    Uma explicação para tantas esnobadas (os CSIs e Desperate Housewives sumiram, também): os votantes vêem dois episódios isolados, submetidos pelos produtores, não a série toda. Grey´s Anatomy mandou aquele da bomba no coração, se lembram? Os acadêmicos (de TV) choraram em esguicho, enquanto os episódios de Lost _ um era a apresentação de Mr. Eko e seu passado na África, no outro o interior da escotilha e seu solitário habitante original eram mostrados pela primeira vez _ deixaram todo mundo que não acompanha a série inteiramente… perdido…”
    Este comentário pertence a Ana Maria Bahiana, uma das mais antigas e importantes colonistas de cinema e música (Globo e outras publicações) em sua coluna “Hollywood Watch” postada em 06/07/2006 na parte de Entretenimentos. Ela entendea fundo dos meandros e das “internas” das premiações todas, Emmy, Tony, Globe Awards e Oscar.
    Meu comentártio:
    Cara, Lost (principalmente), CSI, Boston Legal, Prison Break, Six Feet Under, Kingdom Hospital (que não é igual a estas bostas de Grey’s e ER, é de terror e ficção), Scrubs, dão de dez ou mais nestas séries de m**** de hospital. Não dá para entender estas séries de hospital, são todas iguais e um baita dramalhão mexicano com suas histórias piegas (sempre o drama de quem pega quem, recheado de clichês por fora).
    Como diria Bussunda:
    Fala sério…

  5. Detalhe: deixaram de fora tb My Name Is Earl e o Jason Lee!

    E 24hs é a mesma coisa a cada temporada, se pegar os nomes de cada terrorista das temporadas anteriores e colocar nos atuais e vice versa dá no mesmo! Repetição total!
    Já deu o que tinha de dar!

  6. Paulo de tarso, eh isso ai mesmo o que vc explicou, a referencia de episodios de Lost ou de qualquer outra série é muito fragmentada para os votantes.Tudo bem que é difícil acompanhar todas as séries (nem é possível), mas como está no texto do Ricardo, o EMMY é conservador até a raiz.
    Resta torcer por Lost com o Henry Ian Cusick e pelo Globo de Ouro no ano que vem.

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